Manipulação eleitoral da credulidade: as lições da história brasileira (parte 1)
Artigo publicado no Jornal da Manhã de hoje, dia 18/08/2019.
Manipulação eleitoral da credulidade: as lições da história brasileira (parte 1)
Nas eleições de 2018 experienciamos a influência massiva de fakenews no processo eleitoral pela primeira vez em nosso país. Porém, caluniar adversários políticos na mídia não é novidade. Podemos lembrar o episódio ocorrido no 2º turno da campanha presidencial de 1989 (a primeira depois da ditadura militar) quando o então candidato Fernando Collor apresentou na última semana do horário eleitoral gratuito o depoimento de ex-namorada do Lula dizendo que em 1974 ele lhe teria sugerido que realizasse um aborto. O depoimento de Miriam Cordeiro ocorreu quando Lula passara de 39% para 45 % nas intenções de voto do eleitorado enquanto Collor diminuíra de 48% para 46%, com tendência de queda. Depois do depoimento, Fernando Collor, o suposto “caçador de marajás”, foi eleito com 53,03% dos votos e o resto é história.
O episódio deixou muitas lições. Para os sem caráter de sempre, aqueles que defendem interesses contrários à maioria, a principal delas é que a calúnia conduz à vitória, independentemente de partidos e de programas de governo. Porém, para aqueles que consideram essencial disputar eleições propondo um programa de governo e possuindo uma trajetória política comprometida com esse programa, mesmo cientes do problema, não há, até agora, instrumentos que previnam e combatam com eficácia táticas desleais e ilegais.
Se uma única calúnia interferiu no resultado eleitoral em 1989, o que dezenas delas fizeram na eleição de 2018? Inúmeras mentiras e alegações absurdas, como a do kit gay ou da famigerada mamadeira fálica, foram disseminadas ilegalmente para milhões de eleitores e eleitoras em listas do aplicativo WhatsApp durante meses. Mais de 130 milhões de mensagens mentirosas foram disparadas contra o candidato Fernando Haddad e contra o Partido dos Trabalhadores, tanto do Brasil quanto do exterior.
Como o jornal Folha de São Paulonoticiou em reportagem veiculada em 18/10/2018, empresários brasileiros compraram pacotes de disparos em massa no WhatsApp de empresas especializadas com mensagens difamatórias contra o candidato petista e o PT. Na reportagem, a Folha de São Paulo ressaltou que essa prática era ilegal e estava vedada pela legislação eleitoral. Além disso, houve outros exemplos de propaganda ilegal, como outdoors imensos com conteúdo difamatório contra Fernando Haddad e o PT, principalmente na região Sul do Brasil, e a tentativa de manipulação do voto de empregados por parte de empresários midiáticos.
A despeito das constantes denúncias do cometimento dessas práticas flagrantemente ilegais, no entanto, o Tribunal Superior Eleitoral, então presidido pela Ministra Rosa Weber, e os Tribunais Eleitorais Regionais de todo o país pouco ou nada fizeram para combater e punir, com o rigor da lei, os responsáveis pela disseminação massiva de fakenews de teor calunioso e difamatório.
Mas, para além do possível despreparo institucional para combater e punir devidamente práticas ilegais que envolvem desinformação em eleições, precisamos também refletir porque a população se deixa influenciar tanto pela desinformação, mesmo por aquelas fakenews cujo absurdo intrínseco parece evidente. Uma explicação bastante óbvia é que a credulidade é mais manipulável quando a pessoa carece de meios necessários para dar-se conta do uso manipulativo de suas emoções e deposita sua confiança em textos corrompidos como se fossem informação confiável. Em outras palavras, as pessoas tendem a acreditar em textos escritos divulgados por mídias que propagam apenas desinformação se o texto é compartilhado nas redes sociais por alguém de sua confiança. Nesse caso, dificilmente a pessoa mudará de opinião, mesmo se for confrontada com evidências factuais que demonstrem a falsidade do conteúdo mentiroso ou calunioso.
O que pode ser feito, então, para combater o uso indevido, imoral e ilegal, de mídias sociais para corromper processos eleitorais? Como defender a Democracia no contexto político e social em que mensagens de ódio e práticas contrárias ao bem-estar geral são muito mais populares que mensagens fraternas, verídicas e que defendem interesses gerais? Como combater a credulidade cega de parte significativa da população de nosso país?
Responder estas perguntas é urgente para preservar a democracia e o patrimônio nacional da influência e ações de aventureiros, entreguistas e representantes do capitalismo voraz antes que seja demasiado tarde.
Juvenal de Aguiar – Diretor Estadual da APEOESP e Vice Presidente do PT de Marília - Blog: garraecoragem@blogspot.com;
Maria Elvira Nóbrega Zelante - Professora Aposentada de Português e Literatura
Mariana C. Broens - Professora da FFC/UNESP
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