Base Comum Curricular em discussão. Retrocesso no combate à discriminação e à violência contra a mulher e a comunidade LGBTI
Base Comum Curricular em discussão. Retrocesso no combate à
discriminação e à violência contra a mulher e a comunidade LGBTI
Entrevista especial
com Anna Helena Altenfelder
Nesta semana, a
discussão do texto final do projeto da Base Nacional Comum Curricular - BNCC
entrou em pauta no Conselho Nacional de Educação - CNE. Em novembro, a última
versão do texto, incluindo apenas Educação Infantil e Ensino Fundamental, foi
encaminhada pelo Ministério da Educação ao Conselho, que deve analisar e emitir
seu parecer sobre a matéria ainda antes da sanção do Governo Federal. Entidades
do campo da Educação têm se manifestado por mais debate sobre o texto,
argumentando que são necessárias modificações. O CNE já reconhece que não será
possível finalizar as discussões nesta semana. A expectativa do Ministério era
sancionar a nova BNCC ainda em 2017.
Em meio a muitas
polêmicas sobre o teor desse documento, entre elas as questões de gênero,
letramento e numeramento de crianças na Educação Infantil e ensino religioso
confessional, a presidente do Conselho de Administração do Centro de Estudos e
Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária - Cenpec, a professora Anna
Helena Altenfelder, destaca que essa fase é crucial para a concepção da Base.
Entretanto, salienta: “a construção da Base não se esgota com a aprovação do
texto”. “Após a conclusão desta etapa, serão necessárias políticas sólidas de
formação inicial e continuada dos professores, garantia das condições materiais
de trabalho e por políticas de desenvolvimento profissional, que incluam plano
de carreira, valorização e remuneração de docentes”, completa, na entrevista
concedida por e-mail à IHU On-Line.
Anna reitera que o
sucesso da BNCC está atrelado a sua plena implementação, pois, do contrário,
será mais uma “letra morta”. “Ela precisa ser acompanhada de outras iniciativas
que fortaleçam as redes de ensino na apropriação desse documento e do
engajamento dos professores brasileiros, principalmente quando as discussões
curriculares chegarem aos estados e municípios para a revisão do projeto
político pedagógico de cada escola”, indica. Além disso, defende que é preciso
se conhecer de fato o que é a Base e qual seu propósito. “A BNCC não pode ser
entendida como documento orientador que indica o ‘mínimo’ a ser ensinado, mas,
sim, o que é ‘comum’ a todos os brasileiros e as brasileiras”.
Sobre a versão que
está sendo analisada pelo Conselho de Educação, considera que ainda tem muito o
que avançar. “Os valores do respeito, da solidariedade, da busca do
enfrentamento das desigualdades anunciadas no documento introdutório precisam
estar efetivamente presentes nos direitos de aprendizagem e nos saberes das
diferentes áreas do conhecimento”, explica. Entretanto, lamenta que o texto
faça “apenas breves menções sobre estas questões”.
Anna Helena Altenfelder, presidente do
Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária - Cenpec,
é pedagoga, mestra e doutora em Psicologia da Educação pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. Foi professora e coordenadora do
curso de Psicopedagogia Clínica e Institucional do Instituto Sedes Sapientae,
professora convidada da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Faculdade
Oswaldo Cruz. Atua há mais de quinze anos no Cenpec como formadora, autora de
materiais de orientação para professores, e também como gerente de projetos e superintendente.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como
foi pensada a Base Nacional Comum Curricular - BNCC e, metodologicamente, como
se deu o processo de construção do plano?
Anna Helena
Altenfelder – Desde o início das discussões, o Cenpec, como organização da sociedade
civil, tem participado e valorizado os espaços públicos de discussão com o
objetivo de contribuir para o aperfeiçoamento da Base. Acreditamos que sua
construção é um passo importante para a promoção da equidade, a redução das
desigualdades educacionais e a efetivação do direito a uma educação pública,
gratuita, laica, democrática e de qualidade para todos os brasileiros.
Com a aprovação da
Lei 13.005/14, que institui o Plano Nacional de Educação - PNE, essa discussão
ganhou corpo. O plano estipulou o prazo de dois anos para que a União, Estados,
Distrito Federal e Municípios pactuassem a implantação dos direitos e objetivos
de aprendizagem e desenvolvimento da Educação Básica.
Em 2015, o Ministério
da Educação - MEC realizou um seminário e lançou a Portaria 592, instituindo a
Comissão de Especialistas para a elaboração da primeira versão do documento.
Entre outubro de 2015 e março de 2016, foi realizada uma consulta pública para
receber contribuições de sociedade civil, de organizações, entidades
científicas e profissionais da educação. Foram feitas 12 milhões de
contribuições à primeira versão do documento, que subsidiaram a elaboração da
segunda versão.
Debates
A segunda versão foi
debatida com professores, gestores e especialistas em seminários abertos à
participação pública organizados em parceria com o Conselho Nacional de
Secretários de Educação - Consed e da União Nacional dos Dirigentes Municipais
de Educação - Undime. A partir dessas contribuições, o MEC finalizou, em abril
de 2017, a terceira versão da Base e a encaminhou ao Conselho Nacional de
Educação - CNE, excluindo, porém, a Base do Ensino Médio.
O CNE analisa agora o
documento em uma comissão especial e realizou ainda cinco audiências públicas
para ouvir contribuições sobre a terceira versão. Neste momento, a sociedade
aguarda ansiosa a divulgação do parecer do CNE [1]. Ainda não se sabe quais
recomendações serão incorporadas, nem como o MEC reagirá a essas recomendações,
uma vez que caberá ao ministério homologar o documento final.
Já a nova versão da
Base do Ensino Médio, que deverá incorporar as mudanças previstas na reforma
aprovada neste ano, só deverá ser apresentada no começo de 2018. O conselho se
comprometeu em realizar consultas públicas antes de apresentar seu parecer.
IHU On-Line – Quais
os paradigmas que orientam a BNCC?
É fundamental que
estes princípios e diretrizes anunciados no documento introdutório se
concretizem nos objetivos de aprendizagem de todos os componentes curriculares
Anna Helena Altenfelder – Sua construção está
fundamentada no marco legal brasileiro, como no Artigo 210 da Constituição
Federal, nos artigos 26 a 28 da Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional
- LDB e nas estratégias 2.2 e 2.3 do Plano Nacional de Educação - PNE. O
documento, de caráter normativo, deve orientar as redes de ensino, sejam elas
públicas (federal, estadual ou municipal) ou privadas, na elaboração de seus
currículos e em suas propostas de práticas pedagógicas. Ela também está
ancorada no princípio da equidade, que pressupõe igualdade de oportunidades ao
propiciar patamares de aprendizagem e desenvolvimento aos quais todos têm
direito.
O documento
introdutório da Base também explicita seu compromisso com a educação integral,
entendida como aquela que promove processos educativos sintonizados com as
necessidades, possibilidades e os interesses dos alunos, visando o
desenvolvimento global, ou seja, não só dos aspectos cognitivos, mas também dos
afetivos, sociais, culturais. Enfatiza, também, a importância de uma educação
que faça frente aos desafios da sociedade contemporânea, promova o protagonismo
do aluno e leve em conta a importância do contexto e da aplicação do que se
aprende à vida, possibilitando que os estudantes construam significados e
sentidos positivos sobre aquilo que aprendem.
Cabe ressaltar que é
fundamental que estes princípios e diretrizes anunciados no documento
introdutório, de fato, se concretizem nos objetivos de aprendizagem de todos os
componentes curriculares. Entendemos que estas diretrizes não estão
concretizadas em todos os objetivos de aprendizagem de todos os componentes de
todas as séries, sendo importante uma revisão neste sentido.
IHU On-Line – Dado
que o Brasil é absolutamente diverso, como pensar uma Base Nacional Comum
Curricular levando em conta as nuances de cada região do país?
Anna Helena Altenfelder – Não se trata
de currículo mínimo. É preciso lembrar que a Base indica apenas uma parte do
que deve ser ensinado. Logo após a sua aprovação, as redes de ensino deverão
elaborar seus documentos e orientações curriculares e cada escola precisará
rever seu projeto político pedagógico, olhando para sua realidade e conciliando
conhecimentos universais e locais, de forma a abarcar características regionais
e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos.
Trata-se de buscar o necessário
equilíbrio entre o que é comum e o que se afirma como diferença, reconhecendo
que a diversidade é constitutiva da formação do povo brasileiro.
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A Base precisa sintetizar os
conhecimentos, selecionados em função de sua relevância social, artística
científica e tecnológica. Essa relevância é dada por sua importância tanto para
a vida social como para o próprio processo de aprendizado do conhecimento. Isso
requer contemplar os distintos modos com que o país vem equacionando a questão
da diversidade étnica, social, cultural, regional e linguística que lhe é
constitutiva. É inegável a complexidade de construção de uma base curricular
nacional, que atenda às necessidades de um país tão diverso e desigual quanto o
nosso. Contudo, trata-se de buscar o necessário equilíbrio entre o que é comum
e o que se afirma como diferença, reconhecendo que a diversidade é constitutiva
da formação do povo brasileiro.
IHU On-Line – De que
maneira mais um documento, estabelecendo normas e diretrizes, pode contribuir efetivamente
para a educação no Brasil? O que há de novo na BNCC?
Anna Helena
Altenfelder – A Base surge no cenário atual da educação brasileira como contribuição
fundamental para compor com os esforços já empreendidos, nos últimos anos, por
estados e municípios na construção de suas orientações curriculares. Este é um
passo importante para assegurar o direito de todos os estudantes brasileiros a
uma educação de qualidade. Trata-se de garantir que cada estudante –
independentemente do estado ou cidade onde mora, de sua raça, gênero,
orientação sexual, etnia ou condição social – tenha acesso ao mesmo conjunto de
conhecimentos e de práticas culturais que são fundamentais para o pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação
para o trabalho, como preconiza a Constituição Federal de 1988.
BNCC significa um
retrocesso no combate à discriminação e à violência contra a mulher e ao
silêncio diante do preconceito e da perseguição à comunidade de Lésbicas, Gays,
Bissexuais, Travestis, Transexuais e Pessoas Intersex - LGBTI
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Contudo, se por um
lado a elaboração da Base é necessária, ela não é condição suficiente para que
o país ofereça uma educação de qualidade a todos. Seu êxito depende da sua
implementação. Ela precisa ser acompanhada de outras iniciativas que fortaleçam
as redes de ensino na apropriação desse documento e do engajamento dos
professores brasileiros, principalmente quando as discussões curriculares
chegarem aos estados e municípios para a revisão do projeto político pedagógico
de cada escola.
IHU On-Line – Em que
aspectos a BNCC avança no sentido de garantir uma educação de qualidade em
nível nacional e em que medida apresenta retrocessos à formação plural?
Anna Helena Altenfelder – Novamente, a
BNCC não pode ser entendida como documento orientador que indica o “mínimo” a
ser ensinado, mas, sim, o que é “comum” a todos os brasileiros e as
brasileiras. Para nós, do Cenpec, os conhecimentos “comuns” englobam:
conhecimentos, saberes e práticas sociais, em função de sua alta relevância
científica, artística, tecnológica; e bens culturais, incluindo saberes,
práticas e valores constitutivos da diversidade inerente à população brasileira
e que nem sempre são reconhecidos pela sociedade, como parte de sua identidade
e de sua história comum.
IHU On-Line – Dado
que a aplicação da BNCC será no âmbito dos estados e dos municípios, como deve
ser sua aplicação? Como garantir que seus preceitos prescritivos serão
respeitados?
Anna Helena Altenfelder – Serão
necessárias políticas sólidas de formação inicial e continuada dos professores,
garantia das condições materiais de trabalho e por políticas de desenvolvimento
profissional, que incluam plano de carreira, valorização e remuneração dos
docentes. Lembramos ainda que estados e municípios realizarão a tarefa de
revisar seus documentos curriculares, que deverão contemplar os conhecimentos
locais. Para tanto, é importante que o MEC forneça orientações e apoio técnico
às secretarias de Educação e às escolas, para que estas estabeleçam critérios
de seleção de conhecimentos relacionados às identidades locais e que respondam
às demandas específicas de suas realidades.
IHU On-Line – De que
forma a BNCC faz frente (se é que faz) a projetos de caráter mais conservador
na educação básica, como, por exemplo, a guerra dos fundamentalistas contra a
identidade de gênero ou mesmo a projetos de educação neoliberal que visam
restringir a formação humanista em nome de uma formação utilitarista?
É lamentável a retirada
explícita da recomendação para a abordagem das diferentes formas que manifestam
a discriminação de gênero e de orientação sexual no texto introdutório da BNCC
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Anna Helena Altenfelder – Temáticas
relacionadas ao reconhecimento de direitos e de afirmação de identidades
estigmatizadas – em função do gênero, da etnia, da religião, do grupo social,
da pessoa com deficiência, por exemplo – são relevantes do ponto de vista
curricular e devem ser contempladas na Base. Fazem parte da educação republicana
e democrática. Os valores do respeito, da solidariedade, da busca do
enfrentamento das desigualdades anunciadas no documento introdutório precisam
estar efetivamente presentes nos direitos de aprendizagem e nos saberes das
diferentes áreas do conhecimento.
Nesse sentido, a
terceira versão tem muito a avançar. Ela faz apenas breves menções sobre estas
questões. O Cenpec lamenta a retirada explícita da recomendação para a
abordagem das diferentes formas que manifestam a discriminação de gênero e de
orientação sexual no texto introdutório da Base, que estava presente na versão
embargada, a qual tivemos acesso por meio de jornalistas. O enfrentamento a
essas formas de discriminação – tão arraigadas em nossa sociedade – estão
presentes em documentos oficiais da União desde os Parâmetros Curriculares
Nacionais. Sua exclusão significa um retrocesso no combate à discriminação e à
violência contra a mulher e ao silêncio diante do preconceito e da perseguição
à comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Pessoas
Intersex - LGBTI.
IHU On-Line – Como a
senhora avalia a última versão da BNCC entregue ao Conselho Nacional de
Educação? Quais os avanços e os retrocessos em comparação com as duas versões
anteriores?
Anna Helena Altenfelder – De forma
geral, todas as versões têm problemas. Em cada etapa, o Cenpec buscou
contribuir indicando avanços e pontos de atenção. Com relação à última, em
audiências, seminários e documentos enviados ao CNE, destacamos nossa
preocupação sobre alguns pontos. Alguns exemplos são: a oralidade na educação
infantil, que é pouco abordada e quando aparece está apenas subordinada à
escrita; a introdução precoce de conteúdos gramaticais a partir do 3º ano; a
leitura de textos literários constituir um campo específico de conhecimento,
independente da leitura; a necessidade de aperfeiçoar a relação entre
padronização curricular e a atenção à diversidade. O conjunto completo de
críticas e sugestões do Cenpec foram enviadas ao CNE e estão disponíveis para
consulta.
IHU On-Line – Por que
o Ensino Médio ficou de fora dessa etapa de discussões acerca da BNCC? O que
significa, em termos de educação, tê-lo deixado de lado?
Anna Helena Altenfelder – Lamentamos o fato
de a proposta para o Ensino Médio não ter sido discutida juntamente com a da
Educação Infantil e a do Ensino Fundamental, dado que todas estas etapas
compõem a Educação Básica e, portanto, precisam estar conectadas, especialmente
no que se refere aos momentos de transição entre cada uma delas.
A reformulação do
Ensino Médio já é lei e estipula o quanto da carga horária dos currículos
escolares deverá ser destinado aos objetivos de aprendizagem estipulados pela
Base. Contudo, estabelecer um limite para o cumprimento da Base sem que ela
esteja pronta nos parece temerário. Também não está claro como as redes
estaduais deverão articular a Base à parte diversificada do currículo e à
oferta dos percursos formativos, nem a divisão do tempo para cada uma destas
três frentes curriculares, aspectos que norteiam a reformulação do Ensino
Médio.
IHU On-Line – Quais
os próximos passos da BNCC, depois da sanção dessa etapa que está sob análise
do Conselho de Educação?
Anna Helena Altenfelder – Em sequência à
aprovação da BNCC, estados e municípios realizarão a tarefa de complementá-la,
produzindo suas orientações curriculares próprias que deverão contemplar os
conhecimentos locais. Para tanto, é importante que o MEC forneça orientações e
apoio técnico às secretarias de Educação e às escolas, para que estas
estabeleçam critérios de seleção de conhecimentos relacionados às identidades
locais e que respondam às demandas específicas de suas realidades.
Além disso, é preciso
ressaltar que a construção da Base não se esgota com a aprovação do texto. Após
a conclusão desta etapa, serão necessárias políticas sólidas de formação
inicial e continuada dos professores, garantia das condições materiais de trabalho
e por políticas de desenvolvimento profissional, que incluam plano de carreira,
valorização e remuneração de docentes.
Vale lembrar, ainda,
que a Base exigirá um grande esforço de cooperação, como determina a Lei nº
13.005/ 2014. Embora a implementação seja prerrogativa dos sistemas e das redes
de ensino, a dimensão e complexidade da tarefa vai exigir que União, Estados,
Distrito Federal e Municípios somem esforços, em um teste histórico para a
prática do regime de colaboração, que ainda carece de regulamentação. Para que
isto ocorra, as responsabilidades dos entes federados serão diferentes e
complementares e a União precisará continuar com seu papel de coordenação e
correção das desigualdades.
IHU On-Line – Como a
questão da terceirização do trabalho, relacionado à reforma trabalhista,
impacta as atuais mudanças que dizem respeito à educação básica no Brasil?
Muitos fóruns propõem
que a Base seja aprovada pelo CNE com uma recomendação de que o documento seja
revisto, em um processo participativo, em dois anos
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Anna Helena Altenfelder – É difícil mensurar
os impactos da reforma trabalhista no âmbito educacional. Ainda temos poucos
subsídios para avaliar o assunto. No entanto, há indícios de que a nova
legislação pode dificultar a valorização da carreira docente, tão necessária em
nosso país. A análise produzida pelo Departamento Intersindical de Estatísticas
e Estudos Socioeconômicos - Dieese alerta para alguns riscos como, por exemplo,
a ampliação de contratos de trabalho intermitente ou em tempo parcial e a
possibilidade de acordos individuais ou convenções coletivas se sobreporem à
lei.
É preciso lembrar que
a Lei Nacional do Piso Salarial do Magistério, sancionada em 2008, ainda não é
cumprida pela totalidade dos estados e municípios. Segundo o último
levantamento da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação - CNTE,
oito redes estaduais de ensino não cumprem o piso nacional e não destinam um
terço da jornada para atividades extraclasse. O Cenpec defende que a carreira
docente precisa e deve ser renovada, de modo que a profissão seja valorizada
socialmente. Isso pressupõe formação inicial qualificada e condições de
trabalho adequadas, bem como os salários e planos de carreira.
IHU On-Line – De que
forma a BNCC atualiza os desafios da formação docente no nosso tempo?
Anna Helena
Altenfelder – Em outubro, o MEC lançou a Política Nacional de Formação de
Professores, que prevê a construção de uma Base Nacional Docente, que deve ser
disponibilizada para consulta pública em 2018. Essa política, assim como a
aprovação da Base, também exigirá um grande pacto nacional para a formulação e
implementação de sólidos programas de formação inicial e continuada, o que
somente será possível com a colaboração dos diferentes entes federados, das universidades
públicas e privadas e das organizações da sociedade civil que atuam nessa área.
Sem dúvida, este é um
pré-requisito para o sucesso da BNCC. Isto significa garantir as condições para
que professores e gestores escolares tenham o apoio necessário para que os
objetivos de aprendizagem efetivamente sejam trabalhados em sala de aula, o que
passa pela infraestrutura e condições materiais das escolas e também pelo
cumprimento da Lei Nacional do Piso Salarial do Magistério e desenvolvimento de
planos de cargos e salários adequados para os profissionais da educação,
conforme previsto no PNE.
IHU On-Line – Deseja
acrescentar algo?
Anna Helena
Altenfelder – Sim, uma ideia que tem sido discutida em muitos fóruns é a de que a
Base seja aprovada pelo CNE com uma recomendação de que o documento seja
revisto, em um processo participativo, em dois anos. No nosso entender, este
processo daria maior legitimidade à Base, e também maior qualidade, desde que
envolvesse professores, gestores, famílias e alunos. É importante ressaltar que
as orientações curriculares não são estanques. À medida que são implementados,
devem ser revisitados e atualizados periodicamente.
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